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terça-feira, 24 de março de 2015

De renovação e de fé: um testemunho

Um ano e três meses se passaram desde que parei de beber. Um marco na minha vida, dadas as transformações que se iniciaram a partir dessa simples decisão: parar de beber. Se eu pudesse ver o futuro, e tivesse antecipado tudo o que viria a seguir, talvez tivesse tomado essa decisão  mais cedo e evitado tantas dores no meu caminho... Mas as coisas acontecem da melhor maneira, no tempo de Deus... E é exatamente sobre Deus que eu vou falar hoje!!!

Há alguns anos atrás, como consequência das escolhas que fiz pra minha vida e das decepções, frustrações e mágoas que essas escolhas me trouxeram, eu entrei em crise... Nem sei exatamente onde ou quando a crise começou, só sei que de repente eu já não sabia o que queria da vida, quem eu era, pra onde eu ia... Do dia pra noite, já não tinha prazer de estar com minha família, não tinha nenhuma paciência pro meu filho... Eu só era feliz na balada!!!

Ah, a balada... Um bar, um violão, muitas cervejas e uns beijos na boca... Aí eu esquecia todo o vazio que me consumia a alma... Era o único momento do dia em que eu me sentia feliz, leve, satisfeita... Claro, a balada nos presenteia com grandes amigos... Amigos sempre dispostos a beberem mais uma cerveja com você, e, até mesmo, te levar a experimentar umas coisinhas a mais, se você quiser... Amigos "sinceros", que pagarão tua bebida quando você não tiver dinheiro... Amigos tão vazios quanto você mesmo e, por isso, a companhia perfeita para farras intermináveis...

Minha vida era uma festa... Não havia diferença entre sábado e segunda... Um violão, os melhores amigos do mundo e muitas cervejas, juntos, transformavam qualquer dia num fim de semana... E nem importava se tinha trabalho no outro dia... A gente ia direto, oras... Dormir é para os fracos... E nós? E eu? Ah, eu era uma heroína... Eu era totalmente livre... Eu bebia até cair, simplesmente porque eu queria... Eu ia pra cama com o homem que eu quisesse - afinal, o corpo é meu!!! Eu fazia tudo o que eu queria fazer... Eu era livre!!

Ok, ok... Pausa no delírio para explicar a decisão de parar de beber...

Nessa época, eu não tinha nenhuma consciência de todo o mal que eu estava fazendo a mim mesma... Apenas tinha adquirido uma visão distorcida de como me relacionar com Deus, e estava distante Dele há tanto tempo que nem me lembrava como era ter fé de verdade... Eu queria mudar de emprego, tava insatisfeita, ganhando menos do que precisava pra me manter... Decidi barganhar com o Dono do Mundo: "Deus, se você me der esse emprego que eu tanto quero, com um salário de XX reais, eu faço um enorme sacrifício pra você: eu fico seis meses sem beber. Mas esse emprego tem que vir até março, senão eu não termino de cumprir a promessa." Eu sou muito afoita, né? Afoita e tola!!!

De volta ao delírio... Pensei eu cá com meus botões: oxe, seis meses num instante passam... Eu tinha decido parar de beber no dia 2 de janeiro e voltar no dia 2 de julho. Já tinha até festa programada para o meu retorno à esbórnia... Já estava decretado, dia 2 de julho eu vou tomar tooooodddaaaaassss!!!

"O homem faz planos e Deus ri!!"

Eu não contava era com o fato de que Deus tinha planos maiores pra mim e usou a minha própria arrogância pra me fazer chegar onde Ele queria... Sim, porque Ele pode tudo, tudo, tudo... Mas ele é tão bom, delicado e educado que não nos força a nada, Ele espera a nossa decisão... Mas, claro, quando nós somos teimosos e arrogantes demais, Ele, se for de Seu querer, utiliza-se dessas nossas fraquezas pra nos dirigir ao lugar onde Ele quer que estejamos... E foi assim que Deus fez comigo.

Parei de beber (por seis meses, tá?) e comecei minha árdua penitência para ser agraciada com um favor dos céus... Em janeiro fui chamada pra fazer uma entrevista numa empresa grande, boa, mas o salário que eles ofereceram era metade daquele que eu havia acordado com Deus, fiz uma contra-proposta, mas eles não aceitaram! Passou fevereiro... Pense no sacrifício que foi brincar meu carnaval sem beber... Afe... Quase desisto!!! Descobri aí que carnaval é uma festa pra bêbados!!! Chegou março... A empresa que citei ali atrás ligou pra mim de novo. Os diretores queriam me conhecer. A diretora me fez algumas perguntas, disse que tinha gostado de mim e aceitou minha proposta: eu pago o que vc tá pedindo!! Nem acreditei. Deixei a outra empresa e vim pra empresa nova.

Aí eu já estava há três meses sem beber. Me sentindo só, angustiada, sem minha válvula de escape. Os amigos fiéis, já não ligavam, pois sabiam que eu estava "de recesso". E tudo o que eu podia fazer era dialogar com o vazio imenso que habitava em mim... Os três primeiros meses foram horríveis... Eu sentia falta da bebida e da sensação que ela me dava... Sonhava bebendo... Morria de vontade de tomar uma, uma cerveja só!!! Mas tinha lá o acordo, eu não podia quebrar... Já pensou ficar desempregada?

Bom, emprego novo, três meses apenas para voltar a beber, parecia que tudo tava no lugar que deveria estar... E eu não via a hora de ter de volta minhas noitadas...

Eu só não imaginava que minha vida pudesse mudar tanto a partir daí...

Primeira sexta-feira de trabalho novo, liga a diretora na minha sala: "Margarida, todas as sextas nós temos um culto aqui no auditório. Se você quiser participar, pode vir, viu?"

Como assim, se eu quisesse participar? rsrsrsrs... Como é que uma pessoa recém chegada na empresa vai dizer pra sua diretora "crente": vou não, gata, curto essas coisas não!!!

Tive que ir né?... Não só nessa sexta, como nas seguintes... Toda sexta eu ouvia aquelas pessoas a falarem da alegria que Jesus traz pra vida da gente... a falarem de paz, de entrega, de consolo... Tudo o que eu não tinha em minha vida havia tanto e tanto tempo... Isso me incomodava deveras... Meu vazio, se tornava ainda mais vazio...

Na balada, sem beber, sob o impacto daquelas palavras que eu escutava nas sextas, eu começava a olhar o comportamento dos meus amigos de farra e a enxergar neles a mim mesma: o comportamento vulgar, a facilidade do sexo sem sentido, sem amor, só por ser, o palavreado chulo, os excessos... O vazio dentro de mim doía só de pensar que logo logo eu estaria ali de volta... Eu decidi, então, não voltar a beber. Definitivamente, não era aquilo que eu queria pra mim. Mas eu também não aguentava mais viver com aquela raiva dentro de mim, tanta angústia, um vazio sem fim. E eu não sabia como me livrar dessa dor!!!

Numa bendita sexta-feira, após o culto, minha diretora me sentenciou... Ia ter um tal de Cursilho (eu não fazia nem idéia do que era isso, só sabia que era um encontro de crentes... Afe) e ela queria pagar a participação de duas pessoas que se dispusessem a ir... Nas entrelinhas, ela se dirigiu a mim umas duas vezes, como que indicando o desejo dela de que eu fosse... Que saco, pensei eu... Mas pra agradar a diretora, no emprego novo que eu já estava amando, decidi me oferecer... "Ah, Margarida, eu tinha certeza que você iria. Desde a primeira vez que eu lhe vi, eu soube que Deus tinha planos grandiosos pra você."

Foi só no cursilho (sim, eu mantive minha palavra e participei do cursilho, Graças a Deus) que eu entendi o verdadeiro significado das palavras de Cristina. Cristina Lins, o instrumento que Deus utilizou para me guiar no caminho que Ele queria pra mim.

Eu não posso contar a vocês o que acontece no Cursilho, mas posso dizer que lá, eu tive um grandioso encontro com Deus e comigo mesma. E Ele, em sua infinita misericórdia me perdoou por todos os meus descaminhos, me ensinou a me perdoar, pouco a pouco por todo mal que fiz a mim mesma e me mostrou uma nova maneira de caminhar. Pela primeira vez, em muito tempo eu me senti plenamente feliz (e nem tinha cerveja lá, viu?).

Sair de lá, voltar pro mundo normal, foi a coisa mais dolorosa que já fiz... Cheguei em casa irritada. Eu queria continuar vivendo aquela paz, aquela alegria que experimentei ali no Cursilho. Como fazer? Foi quando me dei conta do mover de Deus em minha vida... Como ele atuou em mim, me dirigindo, me guiando, sem eu saber... Como ele sarou todas as feridas e me fez ver que eu podia sim, ser feliz de verdade... E o recado final estava dado: "venha pra perto de mim!"

Não pensem que foi fácil... Não foi... Os amigos de balada não entendiam minha ausência, me cobravam presença, mas aquele mundo trazia de volta a dor da qual eu tentava me libertar. Eu queria estar perto deles, mas não queria mais viver aquela realidade. Sem falar que uma hora eles iam descobrir que eu tinha mudado, não daria pra esconder pra sempre meu relacionamento com Jesus.

Sim, no Cursilho eu me converti. Decidi que queria viver aquele amor plenamente, que queria Jesus em minha vida. Eu só não sabia como seria difícil assumir isso. As piadas, a rejeição, a ridicularização, os comentários jocosos. Tudo isso me fazia balançar... Mas eu tinha que tomar uma decisão e essa decisão tinha que ser minha, só minha. Olhei pra trás, vi aquela mulher ridícula e irresponsável, bêbada, se entregando a homens a quem não deveria nem cumprimentar e tive vergonha, muita vergonha do rumo que minha vida tinha tomado. Foi quando entendi que a escolha já havia sido feita, que aqueles "amigos" eram ocasionais e que já não faziam mais parte do meu presente. É, eu tinha um presente, um presente dado por Deus. E eu queria ser feliz de verdade.

Um dia desses eu ouvi uma palavra sábia que dizia: "uma brasa fora do fogo acaba apagando". Por isso eu corri pro fogo, pra que a brasa dessa paz que preenche os espaços onde antes habitava o vazio jamais se apague. Essa semana eu renovei meus votos do batismo, disse SIM novamente a Jesus e assumi um compromisso diante de uma nova família, minha família em Cristo: a Paróquia Anglicana Emanoel.

O que eu posso deixar aqui como testemunho de vida é que, quando eu me acreditava livre, era quando eu mais prisioneira fui... Prisioneira de maus hábitos, de atitudes destrutivas contra mim mesma. As pessoas que me viam sorrindo, e cantando, e dançando em meio às bebedeiras costumeiras, não estavam ao meu lado quando eu acordava chorando e sofrendo, sem entender o que havia de tão errado na minha vida. Quem bebia comigo, não sabia do vazio e da dureza do meu coração. Coitados, acho que mal compreendem o seu próprio vazio.

Há mais ou menos um ano atrás eu fui resgatada da lama. Deus, me libertou de todas as correntes que me aprisionavam e me fez, suavemente, enxergar que eu estava destinada a muito mais do que àquele sofrimento constante no qual eu vivia. Pela primeira vez na vida eu fui realmente livre! Jesus me deu escolha, me deu uma alternativa. E eu escolhi ser feliz.

Não é um conto de fadas, ainda tenho problemas de todos os tipos na minha vida. A diferença é a maneira como lido com os problemas que tenho. Entreguei minha dor e meu coração vazio a Deus. Ele me devolveu um coração renovado, em paz e cheio de alegria. Já não preciso de estímulos externos pra me sentir feliz. Minha felicidade vem de estar em Deus, vem da presença cotidiana de Jesus em minha vida. Hoje eu sou um vaso novo. Decidida a me tornar instrumento do Senhor, para cumprir qualquer missão que ele designar pra mim.

Tem uma música que cabe perfeitamente no fechamento desse desabafo e retrata como me sinto hoje:

Eu, eu, eu, eu quero é Deus...
Não importa o que vão pensar de mim,
Eu quero é Deus!!!

"E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas." (2 Coríntios 5:17)